O Brasil tem um costume estranho: o bendito costume de ter se acostumado a ser o país das coisas, assim como se acostumou a ter uma paixão platônica pelas Suas Majestades. São reis e rainhas de todas as formas e tipos: rei do futebol: Pelé; rei da música: Roberto Carlos; rainha dos baixinhos: Xuxa...; e por aí vão as Suas Majestades. Quando alguma Majestade vem visitar o país então... , que reboliço, tudo pára, ruas ficam congestionadas, reforço especial na segurança, tudo para se vê a Sua Majestade, assim é ainda hoje e assim foi no passado, talvez seja saudosismo de nosso tempo Imperial. Somos um povo que proclamou a república, com o povo longe e boquiaberto com o acontecido, para usar uma paráfrase de um contemporâneo do 15 de novembro de 1889. Ainda hoje a antiga família imperial leva sua mesada, seus títulos, e de certa forma, tenta voltar aos seus tempos de glória. Ah, quem dera se tivéssemos uma Majestade, parece que ouço de muitos dos transeuntes que encontro pelas ruas.
Mas deixamos esse papo saudosista para um outro momento, foi apenas um breve comentário, só para deixar um pequeno registro. O que quero deixar registrado nesse momento, de verdade, é que o Brasil tem como característica ser o país das coisas. Já pensou de tantas coisas o nosso Brasil é país? Quem foi o país do algodão e do ouro, lá pela época colonial? Brasil; país do café, lá pela época imperial? Brasil; país da borracha, milho, soja, suínos, frangos, bovinos... já na república? Brasil; e país dos três orgulhos nacionais: carnaval, samba e futebol? Brasil. Mais recentemente, com nossas ótimas equipes, tanto masculina, como feminina, na quadra ou na areia, o Brasil se tornou o país do que? País do vôlei. E olha que essa lista não para por aí, ela segue adiante. O Brasil é o país de todo tipo de coisa, sempre anda em busca de um título a mais.
Todos esses ‘títulos’ enchem o país de orgulho, o “orgulho de sermos brasileiros”, o povo que “não desiste nunca”, mas há um título pelo qual não devemos nos orgulhar: é o título de sermos o país das CPI’s, as Comissões Parlamentares de Inquérito, que nada mais é do que a consequência de um outro título nada honroso, o título de sermos o país da corrupção. Param-se para contar a quantidade de CPI’s que rondam nossos parlamentos, tanto o nacional – senado e câmara de deputados federal –, como nos parlamentos estaduais – câmara de deputados estadual – e nas câmaras de vereadores, nos municípios contaríamos uma infinidade de CPI’s rondando o sono (não seria os pesadelos?) dos corruptos, e talvez também dos não corruptos.
O mais engraçado é que o debate sempre fica de um lado oposição, querendo e prometendo investigar tudo, colocar tudo em pratos limpos, “doa a quem doer!”, dizem nossos nobres deputados e vereadores da oposição. Do outro lado, os governistas travam batalhas para que as tais CPI’s não aconteçam, são telefonemas, e-mail’s, encontros em lugares nada convencionais, e talvez, um dinheirinho extra no fim do mês para aquele que desistir de assinar o requerimento para que a tal comissão de inquérito aconteça. O governo constituído dá seu show a parte e logo saem reclamando em alto e bom tom, para que todos possam ouvir: isto é intriga da oposição, estão querendo desmoralizar o nosso governo, não passa de interesses eleitoreiros. É uma enxurrada de acusações de um lado e outro, sempre repetindo as mesmas frases de efeitos, feitas para serem ditas nestes momentos especiais, cheias de primeiras intenções, com o intuito de mostrar a inocência dos investigados.
Se a CPI segue então, é mais bate-boca na certa, os partidos governistas tentam de tudo para conseguirem os lugares de privilégio na comissão de parlamentares, lugar que permitirá inocentar o acusado. É uma briga feroz, tudo para mostrar para o eleitorado o bom caráter do moço, e também da moça. No fim de tudo, o Brasil acaba somando mais uma CPI em sua história, que somando as tantas outras de já tivemos nos faz ser também, com certeza, o país das CPI, e de quebra o país da corrupção, afinal para que abrir um inquérito se não há crime, em outras palavras, corrupção?
Está aí um título, aliás, um título não, mas de quebra dois títulos que não devemos nos orgulhar. Como seria bom se nossos parlamentos em todas as esferas não necessitassem criar suas CPI’s. Tanto tempo perdido, dinheiro, material humano, palavras soltas contra adversários como dardos. Mas para não haver as tais comissões seria necessário não haver irregularidades, corrupções, crimes na administração pública.
Se não houvesse toda essa banalidade em nossa política as vossas excelências deputados estariam trabalhando para o bem comum, que é o seu real papel, ser a voz daqueles que quem são representantes.
O pior de tudo é que todos nós brasileiros sabemos o resultado de cada uma destas tantas CPI’s, a experiência já nos dá a resposta, é a experiência da repetição, estas CPI’s tem em geral nenhum resultado, nada pune, nada aponta, e tudo continua como antes. Logo vem uma nova eleição, e aqueles que estavam na oposição se tornam governo, e o governo se torna oposição, as mesmas peças, somente estando em lados opostos, e os que antes tanto pediam por uma comissão de inquérito lutam nos bastidores para que elas não aconteçam, e o governo de antes, que agora é oposição, faz de tudo para que haja a tal comissão de inquérito, que de investigativa mesmo só tem o nome.
E o país de tantas coisas, coisas honradas até, fica também com os títulos de país das CPI’s, e país da corrupção...
Israel Goulart – Terça-Feira, 19/05/2009 – pela manhã
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